O prazer em sentir fome e o perigo envolto nisso.

Por Rafael Marques

Não é incomum encontrarmos postagens falando “maravilhas” de passar fome e até o “prazer” que isso possa trazer. Sentir prazer na restrição alimentar é um “resultado” inerente ao ato restritivo há milhares de anos na história da humanidade. Relatos históricos, muitos deles religiosos, muitos deles com finais trágicos.

Sabe-se pela ciência e na prática, no cuidado com os pacientes, que a supressão de necessidades físicas básicas como fome e impulso sexual, assim como de sensações, por exemplo, cansaço e dor, parecem fornecer a estas pessoas a liberação dos seus corpos, do físico e concreto, e permitir alcançar metas espirituais superiores. Contudo, este questionável benefício, sempre se mistura a outras intenções dos pacientes com transtornos alimentares como o emagrecimento, a perda dos atrativos femininos e medo imenso de ganhar peso.

Sentir conforto na dor é, infelizmente, extremamente comum em pessoas que estão em sofrimento psíquico.

Nas palavras do psiquiatra Dr. Daniel Marques: “Algumas pessoas adotam atitudes de autopunição, provocam lesões físicas e/ou destroem a própria vida, causando lesões teciduais, restrição de nutrientes ou uso de substâncias, pois através delas pode-se gerar alterações neurobiológicas capazes de desencadear sensações como: euforia, torpor, pseudo-alívio, alucinações, etc. Porém nada disso é saudável para o corpo ou a psique”.

Relato anônimo de uma paciente que ilustra o processo:

“Tenho prazer em me fazer mal. Me bato, me furo, mas o que me faz mais feliz é ficar com fome. Tenho comido 1, 2 vezes por dia, sempre bem pouco, já perdi uns 4, 5 quilos, e não penso em parar. Vomito às vezes, e também é um prazer enorme. Cada vez que sinto uma tontura eu fico mais feliz. Só não fico sem comer nada porque estou em época de provas e preciso ter o mínimo de energia pra estudar. Mas tenho feito bastante exercícios pra compensar. Minha meta é comer menos de 400 calorias por dia. Sei que é doentio, mas me acalma”.

Todo o tipo de dor merece tratamento, nenhuma é “melhor” que outra.

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Rafael Marques
Nutricionista, coord. da Pós-graduação em Comportamento Alimentar do IPGS, mestre em epidemiologia e pesquisador do Hospital do Coração de São Paulo. Instagram @comportamentoalimentar