Afinal, quem é mesmo você, além de um número em quilos?

Por Amanda Menezes Gallo

Ao longo da minha trajetória profissional acerca dos temas peso, sobrepeso, obesidade, emagrecimento e transtornos alimentares, venho percebendo que há um peso bastante significativo dado ao número apresentado pelas balanças.

A depender do valor mostrado são disparadas emoções positivas, ou repulsa, raiva, frustração, sentimento de inferioridade, de fracasso, e assim sucessivamente.

Até aí não há muito o que se discutir, pois obviamente todos têm expectativas, e, consequentemente, reações diante do alcance ou não dos próprios objetivos. A questão é que venho observando o quão equivocado pode ser o pensamento que pessoas têm a respeito do significado que aquele número na balança pode ter.

O raciocínio quase “lógico” é: “Se emagreci ou mantive o peso ideal, eu me sinto feliz e realizada, praticamente um fenômeno, me sinto totalmente encorajada e capaz de enfrentar as diversas situações da vida, me exponho e curto eventos sociais, frequento salão de beleza ou invisto de alguma forma no meu autocuidado, o engajamento profissional melhora, me sinto mais digna de ser amada, de ir à praia/piscina sem medo, de usar ‘aquela’ roupa que só as magras usam, enfim, sou capaz de dominar o mundo!”. 

A contrapartida dessa “lógica”, quando o peso não está “ideal”, quando a balança mostra o que não se quer ver, é a percepção totalmente deturpada de si, a “menor valia” que as pessoas se impõem, a sensação de não merecimento das coisas, situações ou afetos, uma invalidação quase que total de qualquer possibilidade de reconhecimento sobre algo positivo em si, atribuindo à vida um significado de caos generalizado.

Em suma: “Sou um absoluto fracasso, não tenho força de vontade, não posso ir aos eventos porque vão perceber que estou gorda, todas as pessoas me olham e me julgam, resumo o meu dia a fazer as coisas estritamente necessárias e, se já estou feia mesmo, então pra que me cuidar, fazer unhas, arrumar os cabelos ou investir em um ‘look’ bacana?!” Toda essa percepção distorcida a respeito de si, se traduz num “combo” de dor, sensação de impotência, baixa autoestima generalizada e inércia. 

Não posso ser injusta ou hipócrita e pensar que o ser humano tem que ser conformado, que não tem o direito de sentir-se frustrado em relação ao próprio peso, ou que não faz sentido desejar melhorar. Não se trata disso! Na verdade, o que coloco em discussão é a interpretação que algumas pessoas fazem sobre o quão importante é ver um número “x” na balança, e sobre qual a relação real que esse valor tem com tantas outras habilidades e possibilidades que se pode ter.

Refletir sobre o “peso do peso” é uma oportunidade para lembrar que essa (peso) é apenas uma das características que o ser humano carrega, mas não a única. Muito além da relação peso, altura e IMC (Índice de Massa Corpórea), existe um ser humano, existe alguém com uma vida “em mãos”, capaz de construir, desconstruir ou reformar a si mesmo, a vida, as relações, alguém que, com certeza, tem muito mais características, adjetivos e habilidades para colocar na autobiografia, para compor a própria identidade.

O reducionismo de colocar a beleza de um arco-íris no mesmo patamar que um único tom de cinza pode ser uma forma muito pouco generosa de enxergar a beleza das coisas. Isso me fez lembrar um amigo que dizia que algumas pessoas assistiam a vida passar da janela… Não seja essa pessoa simplesmente por causa do seu peso; assim como o cinza faz parte do “leque” de cores, o seu peso também faz parte de você, mas não representa o seu todo!

Qual o peso do peso na sua vida? Afinal, quem é mesmo você, além de um número em quilos…?!

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Amanda Menezes Gallo
Psicóloga, especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental e Doutora em Distúrbios do Desenvolvimento.