Psicoterapia e Milagre não são sinônimos

Por Amanda Menezes Gallo

Nos atendimentos, frequentemente me deparo com rostinhos frustrados, acompanhados de frases como:

“Melhorei, mas ainda…”, “Não tive compulsão, mas…”, “Não agi por impulso, mas…”, “Fiquei menos ansiosa, mas…”.

Nenhum problema grave nessas frases, tendo em vista que na maior parte do tempo os temas trabalhados em terapia são os desconfortos mesmo. Mas o que me chama a atenção quando escuto afirmações como essas, é a expectativa que eventualmente se têm sobre os efeitos da psicoterapia.

Psicoterapia é um processo, e como todo processo ele se dá em partes, de forma gradativa.

No caso da terapia cognitivo-comportamental, o objetivo é promover, aos poucos, mudanças de pensamentos, sentimentos e comportamentos considerados disfuncionais, respeitando o ritmo e as capacidades de cada paciente. E eis o ponto de reflexão deste texto, o fato de algumas pessoas sentirem-se frustradas quando conseguem efetivar alguma mudança, “mas…”.

Ajustar ou “deletar” pensamentos e sentimentos que ecoavam tantas horas por dia, adaptar comportamentos até então frequentes, a ponto deles serem extintos, ou transformar o paciente em alguém que ele não é, num tempo extremamente curto, não é psicoterapia, é milagre!

A afirmação anterior pode soar óbvia, mas não é. Se por um lado há quem busque esses meios “milagrosos” para atingir as mais complexas mudanças, por outro, há quem se denomine o profissional que irá promover tais mudanças, facilmente, como num passe de mágica.

Pois bem, psicoterapia e milagre não são sinônimos! Portanto, enquanto profissional da psicologia, me permito dizer que somos agentes de saúde que buscam mediar reflexões humanas a respeito de si, e da relação com o mundo.

A partir dessas reflexões, mudanças podem ser promovidas, embora elas não sejam garantidas, pois dependem de muitos fatores, dentre eles, vínculo e confiança entre paciente e terapeuta, engajamento, paciência, tolerância e tempo.

Além disso, como falei anteriormente, as mudanças ocorrem de forma gradativa, de modo que o processo terapêutico pode parecer mais interessante quando o paciente é capaz de reconhecer os ganhos mais discretos, e entender que depende destes para atingir uma meta maior. Obviamente, o terapeuta pode auxiliar e pontuar essas questões.

A verdade é que eu até gostaria de promover milagres, pois possivelmente ajudaria mais pessoas a sentirem bem estar e ter melhor qualidade de vida, mas, infelizmente, não sou capaz; e os meus colegas também não são.

Em relação às frases do início do texto, elas podem ser reescritas de uma forma diferente, mas sem perder o sentido, e ganhando um tom mais generoso em relação ao processo, que se dá em etapas. Fica assim:

“Ainda não…, mas melhorei”, “Ainda não…, mas não tive compulsão”, “Ainda não…, mas não agi por impulso”, “Ainda não…, mas fiquei menos ansiosa”.

Experimente mexer na estrutura das suas frases, e, se necessário, conte com o auxílio de um psicólogo. Quem sabe, assim, consiga valorizar mais o passo a passo das suas “construções”.

0

Amanda Menezes Gallo
Psicóloga, especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental e Doutora em Distúrbios do Desenvolvimento.