Coragem não é ausência de medo.

Por Ana Carolina Costa

Assistindo ao filme “To the bone” (“O mínimo para viver”), que estreiou em 2017 na Netflix, confesso que fiquei impressionada com sua realidade e crueza ao tratar de um assunto comumente glamourizado nos filmes e seriados: os transtornos alimentares, mais especificamente a anorexia nervosa (atenção: este post contém minhas impressões sobre o filme, então se você pretende assisti-lo, continue lendo depois! E se você tem um transtorno alimentar, discuta com sua equipe de tratamento se é o melhor momento para se expor a ele).

Na figura de Ellen, personagem principal que sofre de anorexia nervosa, ficam bem claros três aspectos que coexistem em uma pessoa com transtorno alimentar: a necessidade de controle; a dificuldade em vivenciar e expressar emoções e conflitos; e a ambivalência em querer se tratar.

 

Depois de algumas tentativas frustradas de tratamento, Ellen se vê nas mãos do dr. Beckham, que comanda um residencial terapêutico pouco convencional: lá é valorizada a responsabilidade de cada um perante seu próprio progresso no tratamento, e os pacientes aprendem na prática que nem sempre “tudo vai ficar bem”. Eles são convidados a entenderem o que alimenta sua doença e a exercitarem a coragem para enfrentar seus próprios demônios.

Apesar de ser um filme capaz de promover reflexão e discussão sobre o sofrimento que é ter um transtorno alimentar, há de se considerar que ele tem seus defeitos. Ellen acaba tendo em sua internação um relacionamento romântico com outro personagem, o que é desencorajado durante um tratamento intensivo pois o objetivo é que o paciente aprenda primeiro a estar bem consigo mesmo. Além disso, para algumas pessoas o filme pode ser iatrogênico, isso é, incentivar e “ensinar” comportamentos transtornados. Coloco ensinar entre aspas pois, em meio a tantos perfis doentios nas redes sociais, essa noção me parece um pouco ingênua…

Se você tem filhos adolescentes – que provavelmente vão acabar assistindo – converse abertamente com eles sobre a história do filme e seus personagens. Deixem-nos saber que eles sempre terão apoio e diálogo familiar, sem julgamentos. Questione com eles os padrões de beleza e saúde que têm sido propagados. Ensine-os a serem mais críticos em relação às imagens manipuladas e retocadas na mídia e no Instagram.

Ajude-os a descobrirem os reais valores e interesses que regem suas vidas. E honre-os. Assim, se tornarão pessoas resilientes e entenderão que nem sempre coragem significa ausência de medo.

 

0

Ana Carolina Costa
Nutricionista, atua na equipe de Nutrição do AMBULIM, é membro do The Center For Mindful Eating e autora do Blog ocorpoemeu.com